Por: Professor Raphael Thomé | 17/01/2025
As operações imobiliárias demandam um rigor técnico-jurídico elevado, dada sua relevância social e econômica, tornando contratos e procedimentos envolvidos complexos e burocráticos. Entretanto, busca-se com isso opor segurança jurídica às transações, visando a estabilidade da ordem econômica e social. A partir daí, emerge a necessidade de adequação do contrato às regras e requisitos de direito para sua validade e eficácia, sendo, pois, imprescindível que sejam observados os planos de existência, validade e eficácia do negócio jurídico, tal como sistematizado pela consagrada teoria da “Escada Ponteana” de Pontes de Miranda. Essa estrutura analítica, aplicada aos contratos imobiliários, permite compreender de maneira precisa e sistematizada os requisitos e elementos que sustentam a legalidade, regularidade e a funcionalidade do negócio.
Escada Ponteneana
A teoria da Escada Ponteana, criada pelo jurista alagoense Pontes de Miranda (1892-1979), surgiu como uma das teorias mais influentes para a compreensão da estrutura dos negócios jurídicos, representando uma abordagem sistemática e lógica sobre os elementos essenciais que os compõem. Criada para organizar os conceitos de existência, validade e eficácia dos atos jurídicos, a teoria trouxe maior clareza e precisão para a aplicação do Direito, especialmente em questões contratuais. Esse modelo, que reflete o rigor técnico e a profundidade analítica de Pontes de Miranda, foi amplamente difundido e consolidado pela professora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Titular de Direito Civil da USP, que aprofundou seu estudo e apresentou sua relevância prática no contexto jurídico contemporâneo.
A teoria se destaca por sua capacidade de oferecer um parâmetro claro para avaliar a consistência e a funcionalidade dos negócios jurídicos, contribuindo para a segurança jurídica e a previsibilidade dos atos. Essa sistematização é crucial no campo dos negócios imobiliários e outras áreas, onde contratos complexos e altos valores estão envolvidos, ajudando os profissionais do Direito a identificarem e corrigir eventuais falhas em qualquer estágio do negócio, promovendo maior estabilidade nas relações contratuais e garantindo que os interesse das partes sejam realmente alcançados a partir da celebração de contratos estruturados com correção técnico-jurídica.
A teoria de Pontes de Miranda divide os negócios jurídicos em três planos fundamentais: o plano da existência, que trata dos elementos mínimos necessários para que um negócio jurídico seja reconhecido como tal, ou seja, ingresse no mundo jurídico; o plano da validade, que representa os requisitos necessários para que o contrato seja válido; e o plano da eficácia, que refere à aptidão do negócio para produzir seus efeitos jurídicos no tempo e espaço. Essa divisão proporciona uma abordagem lógica e estruturada para avaliar a conformidade dos atos jurídicos com as normas e princípios do Direito.
O autor da teoria explicava que os conceitos de existência, validade e eficácia são inconfundíveis. Um negócio jurídico pode existir sem ser válido ou eficaz, ou pode ser válido e não produzir eficácia. O mesmo ocorre com as normas jurídicas, sendo possível que existam, mas careçam de validade ou eficácia. Contudo, ele ressaltava que não há como algo ser válido ou eficaz sem existir, pois a validade e a eficácia dependem da existência do ato jurídico. Essa sistematização conceitual contribui significativamente para uma análise mais precisa e objetiva dos negócios jurídicos, garantindo maior segurança e previsibilidade às relações jurídicas.
Os três planos da escada Ponteneana
Plano de Existência
O plano da existência é o alicerce de qualquer negócio jurídico. Ele reúne os elementos mínimos necessários para que o negócio seja juridicamente reconhecido, quais sejam: partes, vontade, objeto e forma. Sem esses elementos, o negócio é inexistente no âmbito jurídico, nada representando para o Direito, conforme a teoria clássica.
Plano de Validade
O plano da validade qualifica os “elementos de existência” do negócio jurídico (partes, vontade, objeto e forma), adicionando-lhes adjetivos que assegurem a sua validade. Logo, para ser válido, não basta o preenchimento dos elementos de existência, devendo estes ser adjetivados das qualidades impostas pelo art. 104 do Código Civil, o qual estabelece que, a validade do negócio jurídico exige:
Partes capazes: As partes devem ser juridicamente capazes, sendo vedada a celebração de contratos por absolutamente incapazes sem representação ou por relativamente incapazes sem assistência.
Vontade livre de vícios: A manifestação de vontade não pode ser maculada por vício, devendo ser livremente manifestada pela parte.
Objeto lícito, possível, determinado ou determinável: É necessário que o objeto do contrato seja lícito, exequível e claramente definido.
Forma prescrita ou não defesa em lei: O contrato deve obedecer a forma estabelecida em Lei para a prática daquele negócio. Nos casos de operações imobiliárias que visam a constituição, modificação ou transferência de direitos reais de valor superior à 30 salários mínimos vigentes à época da sua realização, o negócio deverá ser celebrado por escritura pública, salvo algumas exceções, conforme regra do art. 108 do Código Civil.
Assim, para que possa ser válido, o negócio jurídico precisa atender a todos os requisitos estabelecidos no art. 104 do Código Civil, do contrário, poderá ser considerado nulo ou anulável, conforme disposto nos artigos 166 e 171 do Código Civil, comprometendo não apenas a segurança jurídica, mas também a estabilidade e a confiabilidade das relações contratuais, prejudicando os envolvidos e aumentando os riscos de litígios.
Plano da Eficácia
Mesmo sendo existente e válido, um contrato só produzirá efeitos jurídicos plenos se for eficaz. No mercado imobiliário, o principal requisito de eficácia nas operações envolvendo direitos reais é o registro do título no cartório de registro de imóveis, através do que, na forma do art. 1.227 do Código Civil, se constitui, modifica e transfere direitos reais. Assim, enquanto não registrado o título, o negócio jurídico não atingirá sua eficácia plena, como exemplo da compra e venda, onde, sem o registro, o comprador não adquire a propriedade.
Além do registro do título como indispensável na forma do art. 1.227 do Código Civil, o ordenamento jurídico brasileiro apresenta diversas outras regras contidas em leis esparsas que estabelecem requisitos de eficácia à negócios imobiliários, como, por exemplo, o Decreto-Lei nº 58/37, a Lei nº 8.245/91 (Lei do Inquilinato), a Lei nº 9.514/97 (alienação fiduciária), entre outras.
Conclusão
No momento da estruturação e redação de um contrato, especialmente no contexto das operações imobiliárias, é indispensável a observância dos planos de existência, validade e eficácia do negócio jurídico, para garantia da segurança jurídica e do sucesso das transações. Por outro lado, o descumprimento de regras e requisitos constantes do ordenamento jurídico poderá acarretar a nulidade absoluta ou relativa do negócio ou ainda torna-lo ineficaz, comprometendo a estabilidade das relações e a paz social, em razão de litígios muitas vezes longos e onerosos aos envolvidos.
Entender e aplicar de forma meticulosa os requisitos e peculiaridades de cada plano da Escada Ponteneana assegura que as negociações estejam alinhadas às normas de direito e que seus efeitos sejam plenamente atingidos.
Nesse sentido, é imprescindível que o profissional do mercado imobiliário, seja advogado, corretor ou outro especialista da área, invista no aprofundamento de seus conhecimentos e na constante atualização frente às mudanças legislativas e jurisprudenciais. Ademais, contar com um banco de minutas bem estruturado e continuamente revisado é um diferencial estratégico. Modelos elaborados por profissionais experientes e adaptados às necessidades específicas do setor imobiliário não apenas economizam tempo, mas também asseguram que os instrumentos contratuais atendam às particularidades de cada negócio e aos requisitos de existência, validade e eficácia do negócio. Esses documentos servem como base para negociações seguras, eficientes e alinhadas à realidade do mercado, refletindo a expertise e a dedicação do profissional ao oferecer soluções completas e eficazes para seus clientes.
Como advogado com quase duas décadas de experiência jurídica em direito imobiliário, sucessório e cartorial, seja atuando, boa parte desse tampo, como tabelião de notas sub-rogado, seja como advogado, desenvolvi modelos contratuais ajustados às peculiaridades das operações imobiliárias, incorporando não apenas os requisitos legais, mas também práticas de mercado que garantem segurança e eficácia às transações. Esses modelos são constantemente revisados para acompanhar a evolução normativa e jurisprudencial, refletindo a minha preocupação com a qualidade técnica e a proteção dos interesses dos meus clientes.
Dessa forma, ao considerar a aplicação da Escada Ponteneana na elaboração e execução de contratos, é indispensável atentar para cada plano – existência, validade e eficácia – como fundamentos essenciais para a segurança e efetividade das transações imobiliárias. A utilização de minutas bem elaboradas, revisadas continuamente e ajustadas às especificidades do mercado, como as que desenvolvi ao longo da minha trajetória profissional, torna-se não apenas um recurso valioso, mas também uma garantia de excelência. Esses instrumentos, aliados à observância das regras jurídicas aplicáveis, traduzem-se em soluções que refletem o compromisso com a qualidade técnica e a segurança dos negócios, fortalecendo a confiança dos clientes e contribuindo para o desenvolvimento ético e sustentável do mercado imobiliário.
Portanto, é hora de agir, seja você advogado ou corretor de imóveis! Invista na qualificação técnica e no uso de ferramentas que realmente fazem a diferença. O mercado exige profissionais cada vez mais preparados e diferenciados, capazes de oferecer soluções seguras e personalizadas que garantam o sucesso de cada transação. O futuro do mercado imobiliário começa com as decisões que você toma hoje!